"Meus filhos terão computadores, sim, mas antes terão livros. Sem livros, sem leitura, os nossos filhos serão incapazes de escrever - inclusive a sua própria história." Bill Gates

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Os corcundas de smartphone


Estudos apontam que pessoas que fazem uso intensivo dos aparelhos de smartphone
ao longo do dia começam a apresentar problemas de coluna decorrente da má postura
Guito Moreto / Agência O Globo
publicado originalmente em O Globo

Uma nova geração toma conta das ruas. Não tem gênero nem idade, mas compartilha a mesma obsessão e uma maneira distinta de ver o mundo: por meio das telas de seus telefones. São os corcundas de smartphone, um grupo numerosíssimo que faz a Humanidade “evoluir” mais um passo: da posição ereta para a curvada. Dentro de casa, em ruas, restaurantes, bares, shows, ônibus, trens e até ao volante, eles estão por toda parte. E o mais alarmante: especialistas garantem que estão todos doentes física e socialmente.

- O problema é que o grau de intensidade desse uso é tão grande que a pessoa não consegue se concentrar em outra coisa além do celular - alerta a socióloga e professora da Universidade Metodista de São Paulo Luci Praun. - O uso que se faz do aparelho não está ligado ao espaço que a pessoa frequenta. Então, ela vai mesmo para outro mundo.

Luci, no entanto, não concorda com a tese de que essa geração vive mais no mundo virtual. Essa não é a questão, segundo ela. Na maior parte do tempo, as pessoas estão, pelo telefone, relacionando-se com aqueles que fazem parte de seu convívio social. Então, por que o smartphone mesmo?

- Em minha tese de doutorado pesquisei amplamente a questão da influência dos telefones celulares no cotidiano das pessoas - conta Sandra Rúbia da Silva, doutora em Antropologia Social e professora de Comunicação da Universidade Federal de Santa Maria (RS). - Meus entrevistados diziam que não conseguiam viver sem o telefone celular, que o aparelho havia mesmo se tornado uma parte de seu corpo.

Para Sandra, esse tipo de obsessão gera, sim, uma alienação social, na medida que as pessoas facilmente se desligam de conversas no mundo real para checar mensagens e notificações nas redes sociais. Tanto Sandra quanto Luci acreditam que a questão é a falta de foco, que afeta tanto as relações interpessoais como o trabalho e a educação.



E o problema não tem mesmo idade. A economista Carolina Gomes já perdeu a conta do número de vezes que reclamou com seu pai, de 62 anos, por ele estar com o telefone à mesa.

- Meu pai sempre foi o mais chato com o jantar. Todo mundo tinha que estar pronto na hora certa, era o momento da reunião familiar - lembra. - Mas agora ele leva o telefone para a mesa e sempre tem a desculpa de que precisa mandar um e-mail. Na verdade, poderia fazer isso em outro momento. Eu noto (esse comportamento) em todo lugar, principalmente com meus amigos. Hoje tento me policiar, já notei que esse problema é uma falta de educação.

É a tal da doença social, com impacto direto em todos os aspectos da vida. De acordo com Luci, não é algo que parta do indivíduo. É, sim, uma demanda exacerbada pela produtividade constante do trabalho que acabou se transportando para outros campos.

- As pessoas estão adoecendo, pois se sentem cobradas. Há um grau de ansiedade embutido nesse processo, sempre temos que dar conta — avalia a socióloga. — A sensação de que as 24 horas do dia não são suficientes é generalizada. É necessário pensar esse fenômeno para além do vício em smartphones.

Escreve certo. Anda em linhas tortas

A necessidade de interagir o tempo inteiro faz com que o técnico em química Leonardo Medeiros não tire o aparelho das mãos. Ele é um dos que corroboram uma pesquisa divulgada em janeiro pela Universidade de Queensland, na Austrália, que mostrou que a mania de escrever ao telefone no meio da rua está mudando a forma como as pessoas caminham.

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