Alexandre Matias, no Estadão
Iphoneiros em polvorosa: “Vão poluir minha timeline!”, reclamavam usuários do celular da Apple tanto no Brasil quanto no exterior. Eles haviam recebido a notícia de que o aplicativo Instagram havia ganhado, na semana passada, uma versão para Android, o sistema operacional rival do iOS, do iPhone. Por aqui, a indignação veio no inevitável tom de piada característico da nossa vida digital tropical, com a criação de tumblrs como o androidnoinstagram.tumblr.com ou orkutgram.tumblr.com, entre outros. O teor dos tumblrs – e das piadas – era sempre o mesmo: agora o Instagram perderia o seu status, pois uma tal “horda de pobres” começaria a usar o aplicativo.
Para quem não conhece, o Instagram é mais do que um software para celular que permite tirar fotos com filtros vintage. Criado pelo brasileiro Mike Krieger, o aplicativo também funciona como uma rede social – em que é possível assinalar contatos e personalizar perfis como em qualquer site deste tipo, com duas diferenças cruciais. A primeira: é uma rede social feita para o celular. Ela se replica, ao gosto do freguês, pelo Twitter e Facebook, mas seu ambiente nativo é a internet móvel. A segunda é o fato de não existir perfil público. Quem quiser ver a página de alguém no Instagram, ao contrário da maioria das redes sociais, precisa criar uma conta lá.
Eis o motivo da chiadeira. Enquanto era uma rede fechada para usuários de iPhone, o Instagram criou uma bolha de falso glamour que fazia qualquer fotinha vagabunda parecer cool só porque vinha com um tom sépia, com um amareladinho com cara de foto tirada nos anos 70. A reclamação dos antigos usuários levantou a velha falácia repercutida sempre que qualquer serviço online deixava de ser exclusivo de uns poucos early-adopters – a tal “orkutização”.
O termo surgiu, claro, depois que o Orkut começou a se popularizar no País. Antes restrita a quem trabalhava com comunicação ou tecnologia, a rede social aos poucos foi compreendida por pessoas que não passam o dia inteiro na frente do computador. Mais do que isso: à medida em que os anos 2000 foram passando, mais gente pôde comprar um computador e, com isso, a rede social perdeu o ar de ser exclusividade de grupos pequenos. E aos poucos começariam a aparecer perfis de pessoas que não eram descoladas e modernas, mas apenas… normais.
E riam “kkkkkk” ou tiravam fotos em quaisquer situações (parte delas indo parar em sites como perolas.comou tolicesdoorkut.com) ou não se preocupavam com o português correto ou com “about me” espertinhos. A orkutização vinha acompanhada de uma reclamação obtusa, que resmungava sobre a “maldita inclusão digital” num tempo em que nem todo mundo tinha acesso à internet.
Em menos de dez anos, este quadro mudou – radicalmente. Não só ficou mais fácil comprar computador como a internet móvel trouxe uma imensa leva de pessoas para o dia a dia eletrônico das redes sociais. E cada novidade descoberta pelos primeirões era, em pouco tempo, “orkutizada”. Foi assim com o Twitter, com o Facebook e agora aconteceu com o Instagram.
“Em vez de crème brûlée vamos ver fotos do Habib’s”, alguém twittou, como se os usuários do Instagram não tirassem foto de qualquer PF com um filtro para parecer que não estavam comendo em um restaurante self-service. Ou como se os celulares que rodam o sistema operacional Android não custassem, em alguns casos, até mais do que o preço de um iPhone 4S.
A “orkutização” ou a “maldita inclusão digital” fazem parte da natureza da internet. A rede não é um clubinho exclusivo para uns poucos e bons. Até o fim desta década, todos estaremos conectados a ponto de nem percebermos a separação entre o online e o offline.
Reclamar que mais gente está desfrutando de serviços e produtos que, até determinada época, eram exclusivos de um número pequeno não é apenas reacionarismo barato – é não entender que a natureza digital agrega em vez de separar. Se você tem vergonha de estar na mesma rede social que pessoas que considera “menores”, não tenha dúvida: o problema é seu.
via Pavablog
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