Após muitas caminhadas por muitas
organizações nos últimos anos, conclui que o maior impedimento para uma
introdução bem-sucedida do lean é o sistema de gestão moderna que foi
introduzido no início do século 20 pela General Motors e foi adotado por
muitas organizações. Esse é o tipo de gestão que a maioria de nós tem
aprendido, tanto na escola como no trabalho. Há, é claro, um sistema de
gestão contrastante, iniciado pela Toyota logo após a Segunda Guerra
Mundial, o qual facilita a introdução da mentalidade lean.
Por essa questão ser tão fundamental para o sucesso da Comunidade Lean, pensei ser útil oferecer uma simples comparação entre os dois sistemas. Na figura abaixo listei algumas práticas da gestão moderna à esquerda e as comparei com as práticas da gestão lean à direita.
Gestão Moderna | vs. | Gestão Lean |
Autoridade | vs. | Responsabilidade |
Resultados | vs. | Processo |
Dar respostas | vs. | Fazer perguntas |
Planos | vs. | Experimentos |
Educação formal | vs. | Aprendizado no gemba |
Processo de melhoria por meio de assessores | vs. | Processos de melhoria pelos gerentes e equipes de linha |
Tomadas de decisões remotamente com dados | vs. | Tomadas de decisões no gemba com fatos |
Padronização pelos assessores | vs. | Padronização pelas equipes e gerentes de linha |
Vá rápido para ir | vs. | Vá devagar para ir rápido devagar |
Foco vertical | vs. | Foco horizontal |
Esta lista precisa de alguma elaboração, então deixe-me explicar esses pontos um por um. Em cada caso, descreverei uma prática de gestão moderna primeiro e depois a compararei com uma prática alternativa de gestão lean. Acredito que isso será útil - e interessante também - para você determinar qual o tipo de sistema de gestão que rege sua organização.
Autoridade vs. Responsabilidade
Gerentes modernos buscam autoridade para agir, referindo-se ao organograma. O gerente que pensa dessa forma está dizendo ao chefe, "não me dê a responsabilidade por nenhuma ação sem me dar autoridade sobre as pessoas e recursos envolvidos". De certo, todos nós já dissemos isso pelo menos uma vez - e provavelmente dizemos sempre - em nossas carreiras em organizações de gestão moderna. Note que enfrentar problemas importantes em todos os departamentos e funções exige reorganização. Como esperado, descobri que a reorganização infinita é um dos maiores contos de fada da prática da gestão moderna.
Os gerentes lean buscam responsabilidade para enfrentar questões importantes, liderando como se não tivessem nenhuma autoridade. Liderar sem o benefício da autoridade é realmente perigoso para qualquer organização, pois mesmo em organizações baseadas na autoridade, os gerentes raramente têm controle sobre tudo que toca o processo. Entretanto, liderar sem autoridade não é visto como racional em organizações tradicionais e, inevitavelmente, resulta em conflitos.
A dissociação da responsabilidade com a autoridade é, talvez, a ideia mais importante que aprendi com John Shook, que aprendeu isso durante anos como gerente na Toyota. O método que os gerentes lean usam para liderar sem autoridade é a análise A3. Enquanto trabalham no problema, na causa raiz e nas melhores contramedidas, em um diálogo com todos os envolvidos no processo, eles "fabricam a autoridade" para desenvolver melhorias sustentáveis.
Resultados vs. Processos
Os gerentes modernos gerenciam por resultados, para fazer com que seus esforços pareçam efetivos no final de algum período (quando os problemas já ocorreram). Infelizmente, nunca houve uma métrica inventada que, de alguma forma, não pudesse ser usada para fazer com que os resultados pareçam melhores do que eles realmente são. Como um vendedor de carros me disse uma vez sobre a métrica de satisfação do cliente, usada pela montadora que fornecia seus veículos, "é muito mais fácil atingir os números do que consertar uma loja, então é isso que eu faço, e tenho obtido muito êxito".
Os gerentes lean gerenciam por processos, conhecendo sempre a condição de seus processos (o qual produz os resultados), então, os problemas podem ser resolvidos e as melhorias implementadas antes, e não depois, dos fatos. Isso está baseado no entendimento de que um bom processo produzirá bons resultados.
Claro, a fim de obter êxito, o gerente lean deve entender profundamente o processo em questão. Esse é o grande impedimento da gestão por processos que a maioria das organizações de gestão moderna veem, onde os gerentes tradicionais frequentemente parecem ter apenas a vaga noção de como os processos realmente funcionam e estão se desempenhando atualmente. Eu terei mais a dizer depois nas práticas do entendimento dos processo.
Dar respostas vs. Fazer perguntas
Os gerentes modernos dão respostas a seus funcionários diretos sobre a natureza de uma problema e sua solução.
Os gerentes lean sugerem perguntas aos responsáveis pelo problema sobre a sua natureza e as melhores contramedidas disponíveis. Fazendo isso, automaticamente transferem a responsabilidade pelo problema do maior para o menor nível de gerente, que está mais próximo do problema.
Na gestão baseada na autoridade, o gerente de maior nível mantém a ilusão de estar no controle e aceita a responsabilidade pelos resultados de seus subordinados, mesmo que a melhor coisa a se fazer seja impossível para os gerentes de maior nível.
Planos vs. Experimentos
Os gerentes modernos fazem grandes planos, pressupondo que funcionarão por serem longos e detalhados. As funções do colaborador de menor nível é seguir o plano, pois ele foi cuidadosamente desenvolvido por pessoas instruídas. Essa abordagem normalmente os leva a focar a avaliação da conformidade e a determinação de um culpado quando o plano falha.
Os gerentes lean tratam cada plano como um experimento, com um PDCA contínuo e rigoroso. Essa abordagem leva-os a focar a descoberta rápida de como os planos estão funcionando (o C) e, então - a verdadeira ação importante (o A) -, rapidamente planejam e implementam as contramedidas, enquanto o plano, se for igual à maioria dos planos, tem problemas.
Educação formal vs. Aprendizado no gemba
Os gerentes modernos buscam educação formal para progredirem em suas carreiras, frequentemente fora da empresa, em escolas de gestão ou dentro da empresa por meio de educação executiva em uma "universidade" corporativa.
Os gerentes lean procuram o aprendizado no gemba dentro de suas organizações, participando de ciclos frequentes de A3 durante suas carreiras, orientados por gerentes do próximo nível superior com mais experiência na empresa.
Processos de melhoria por meio de assessores vs. Processos de melhoria pelos gerentes e equipes de linha
Os gerentes de linha modernos melhoram os processos, terceirizando os problemas para funcionários ou consultores.
Os gerentes de linha lean melhoram os processos, liderando diretamente as atividades de melhoria em um diálogo com todos que tocam o processo, trazendo assessores ou consultores apenas quando necessário em questões técnicas maiores. É com essa prática que os gerentes lean conhecem mais sobre o processo que eles estão gerenciando, e isso parece tão óbvio que fico maravilhado e preciso registrar.
Ainda assim, caminhei de empresa em empresa nos últimos anos, onde os gerentes de linha não tinham nem o conhecimento nem a intenção de melhorar nada. Eles conseguiram, entretanto, adquirir habilidades avançadas para delegar aos assessores e analistas e terceirizar aos consultores!
Tomadas de decisões remotamente com dados vs. Tomadas de decisões no gemba com fatos
Gerentes modernos tomam decisões remotamente, analisando dados, geralmente em salas de reunião, longe do gemba. (Isto é frequentemente chamado de "gestão da sala de reunião").
Os gerentes lean tomam decisões no gemba, no local do problema, transformando os dados em fatos comprovados. O mantra agora famoso "Vá ver, pergunte por quê, demonstre respeito" captura o espírito da tomada de decisão baseada no gemba.
Padronização pelos assessores vs. Padronização pelas equipes e gerentes de linha
Os gerentes modernos padronizam os processos, confiando em especialistas. Ou, mais provavelmente, eles nunca se esforçam seriamente para padronizar os processos que estão gerenciando ou suas próprias práticas de gestão - o que é, por si só, um processo que exige padronização.
Os gerentes lean padronizam os processos por meio do envolvimento com as próprias mãos de todas as pessoas envolvidas no processo, usando especialistas de fora apenas quando necessário.
Ir rápido para ir devagar vs. Ir devagar para ir rápido
Os gerentes modernos vão rápido para irem devagar, porque os problemas nunca são completamente entendidos e as contramedidas rápidas postas no lugar não enfrentam (e, de fato, não são capazes de enfrentar) a questão real, levando a retrabalhos.
Os gerentes lean vão devagar para irem rápido, levando tempo no início para entender completamente o processo e seu propósito, por meio do diálogo com todos os envolvidos (muitas vezes incluindo o cliente e os fornecedores), e para entender completamente a causa raiz dos problemas e da contramedida mais promissora antes de agir.
Desde a infância, tive amigos e colegas que foram "estudantes
rápidos", aparentemente capazes de analisar problemas e agir mais rápido
que eu. E por anos senti-me mal por parecer ser tão lento. Então, de
repente, ocorreu-me que esses guepardos eram rápidos, principalmente
porque eles nunca entenderam o problema por meio de um processo ou mesmo
de seus propósitos. Eles ficavam pulando para soluções e então
avançavam antes que os resultados pudessem ser avaliados. Então, fiquei
muito satisfeito quando um gerente lean em uma empresa que eu visitava
finalmente formalizou para mim essas alternativas.
Foco vertical vs. Foco horizontal
Os gerentes modernos focalizavam verticalmente a organização, com todas as funções e silos orientados em direção ao CEO, no topo. Isso combina perfeitamente com a gestão baseada na autoridade, meu primeiro ponto de contraste anteriormente.
Os gerente lean focalizam horizontalmente no fluxo de valor por toda a organização, do conceito inicial ao produto acabado e da matéria-prima ao cliente. Isso só pode funcionar utilizando a gestão baseada na responsabilidade, na qual os gerentes lean pensam horizontalmente para resolver problemas por meio do diálogo com muitos departamentos e funções sobre os quais eles não têm (e não podem ter) nenhuma autoridade.
Perceba que este último contraste não é apenas uma questão de mentalidade. Deve ser também a forma com que os gerentes agem todos os dias se o valor para o cliente for otimizado, engajando todas as pessoas envolvidas no processo em melhorias regulares. É a chave para criativamente unir propósito, processo e pessoas em uma empresa lean.
Jim Womack
Senior Advisor
Lean Enterprise Institute
Traduzido por Tamiris Masetto Manzano.
fonte: Lean Institute Brasil
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